segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Adormecida...Castro Alves




Uma noite,eu me lembro...

Ela dormia

Numa rede escostada molemente...

Quase aberto o roupão...solto o cabelo

E o pé descalço do tapete rente.


Estava aberta a janela.

Um cheiro agreste

Exalava as silvas da campina...

E ao longe, num pedaço do horizonte,

Via-se a noite plácida e divina.


De um jasmineiro os galhos encurvados,

Indiscretos entravam pela sala,

E de leve oscilavam ao tom das auras,

Iam na face trêmulos- beijá-la.


Era um quadro celeste!...

A cada afago

Mesmo em sonhos a moça estremecia...

Quando ela serenava... a flor beijava-a...

Quando ela ia beijar-lhe... a flor fugia...


Dir-se-ia que naquele doce instante

Brincavam duas cândidas crianças...

A brisa, que agitava as folhas verdes,

Fazia-lhe ondear as negras tranças!


E o ramo ora chegava ora afastava-se...

Mas quando a via despeitada a meio,

Para não zangá-la... sacudia alegre

Uma chuva de pétalas no seio...


Eu, fitando esta cena, repetia

Naquela noite lânguida e sentida:

" Ó flor!... tu és a virgem das campinas!"

"Virgem!...tu és a flor da minha vida!..."


S.Paulo, novembro de 1868

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